Monthly Archives: May 2009

Benfica SAD

A recente decisão da CMVM de suspender a acção do Benfica esconde um problema grave que afecta toda a Euronext Lisboa: a extrema falta de liquidez.

Neste caso e ao que parece, uma decisão sobre substituição do treinador levaria a variações tão importantes do preço da acção que o regulador se viu na obrigação de suspender o trading da acção. A liquidez da acção da SAD é ridiculamente baixa.

Lembro que a SAD mal chegou ao break-even a nível do resultado líquido, este ano. O resultado operacional (depois de amortizações) teve uma queda brutal, passando de €22,7 milhões em 2007 para €5,8 milhões em 2008.

O Benfica pode escolher vários caminhos para a próxima temporada. O mais fácil é a mudança de treinador, comprar mais jogadores e aprofundar os seus problemas financeiros. O mais difícil passa pela contenção de custos, provavelmente mantendo o mesmo treinador e desenvolvendo a equipa actual, para melhorar o seu resultado financeiro. Dou uma probabilidade de 40% disto acontecer, ou seja, bastante alta, mas mesmo assim não o cenário mais provável. Sim, porque o mais provável é que realmente haja mudança de treinador, novos jogadores e uma deterioração da situação financeira.

Penso que a acção, que não tem parado de descer, mesmo assim está cara. Se olharem para o próximo gráfico, vão ver três curvas. A curva a amarelo mostra o preço da acção, indexado ao PSI-20 (este último em verde) durante os últimos 6 meses. Mostra que depois de anunciar resultados em Março (tarde!) a acção não para de perder terreno.

Do lado direito podem ver o rácio TEV/EBITDA (curva a azul) que mostra o valor de “Total Enterprise Value” dividido pelo resultado operacional (antes de amortizações) e confirma o que estou a tentar dizer: o múltiplo do EBITDA, tendo em conta os fracos resultados apresentados em 2008, continua a ser elevado, chegando a 4,3x actualmente.

Fraca liquidez da acção, substituição do treinador e fraca estratégia, resultados financeiros fracos… O Benfica já teve melhores dias.

"Palme d’Or" do festival de Cannes – A fita branca

Mais uma vez se comprova que o Festival de Cannes constitui uma verdadeira alternativa à cerimónia dos Óscares. A diferença não está no tipo de temas galardoados, mas sim na sensibilidade Europeia dos juris. Não é de facto nada de novo que filmes sobre a Segunda Guerra Mundial apareçam nas nomeações americanas, na realidade a nossa geração anda a ser bombardeada de filmes sobre a Grande Guerra desde sempre. No entanto, os que foram premiados nos Óscares contém sempre um pouco a visão redutora (americana) dos bons e dos maus (“Saving private Rian”) ou dos bons no meio dos maus (“Schindler’s list”) e no fim vêm os Americanos e salvam tudo. O busílis é que quando salvaram tudo, os Americanos fizeram uma clausula de distribuição cinematográfica associada ao plano Marshall e ensurdaram o cinema Europeu e as suas redes de distribuição. Digamos que Cannes é um pouco o outro lado da moeda. Com o filme alemão “Das weiße Band” – “A fita branca” não há os bons e os maus, mas sim uma depicção devota e vivida das relações familiares na Alemanha no período das duas guerras mundiais. No fundo, as raízes da violência estão contidas na cultura das populações. A transmissão deste tipo de análises nunca podia ter proveniência no cinema Americano tão habituado a facilitar a compreensão das massas, redutor e sensacionalista. A fita branca é um filme que não é “fácil”, mas que faz pensar. E os paralelos com a nossa cultura familiar lusitana da época não deixaram de ter consequências políticas na história de Portugal.

A escavadora

Uma vez numa daquelas ridículas sessões de convivência entre colegas promovida há alguns anos pela empresa onde trabalhava, tive o prazer de conduzir uma escavadora. É realmente uma sensação de poder. Tratava-se de uma máquina JCB com movimentos precisos e uma grande força.

Estou a falar disto porque, quando penso na reacção dos nossos governantes à presente crise, só me apetece pegar numa escavadora e calmamente destruir vários edifícios das nossas mais prestigiadas instituições. Depois punha-se tudo na rua e recomeçava-se de novo com gente diferente.

Estejam descansados, não vou fazer tal loucura. Seria considerado um lunático e seria preso. Só me resta escrever num blogue, que é uma forma mais pacífica de exprimir discordância.

Que fique claro que para mim, a actuação da CMVM tem sido muito fraca.
Só uma premissa básica antes de abordar o assunto: Em Portugal há um grave problema de produtividade e por isso as empresas naturalmente não procuram estar cotadas na bolsa, já que isso muitas vezes iria expor a que ponto são ineficientes quando comparadas com as suas congéneres Europeias. Isto explica a razão pela qual há tão poucas empresas portuguesas a quererem ser cotadas na bolsa. Os empresários podem oferecer os argumentos que quiserem, a bolsa não é para todos.

Li um comentário à actuação de Carlos Tavares neste post. Não concordo inteiramente com a conclusão do mesmo, que parece ser que o Dr. Carlos Tavares devia parar de fazer declarações à imprensa. No meu entender, haveria que exigir mais dele, exigir que tivesse agenda própria. Que defendesse os interesses dos investidores. Que organizasse um mercado de capitais eficiente, com regras bem conhecidas e por todos respeitadas.

Ainda no mesmo post parece-me que existe uma alusão ou mesmo que é apresentado um argumento que muitas vezes se lê na imprensa: a CMVM devia ser um regulador leve, para que as empresas se mantenham cotadas. Eu estou de acordo, mas dentro de certos limites e não penso que seja um argumento válido justificar uma situação de “vale tudo” com base numa suposta protecção das empresas cotadas e para impedir que estas saiam de bolsa. Trata-se de um sofisma na minha opinião. Nunca se viu uma empresa sair da bolsa porque tem demasiadas obrigações. Como tenho dito, parece-me que há dois países: o das empresas cotadas e de grande dimensão, e o resto. A EDP, Brisa, Jerónimo Martins e outros grandes grupos fazem parte de um país próspero, na sua maioria de empresas baseadas em Lisboa e que têm bons resultados. Têm toda uma estrutura de apoio sob forma de bancos e gabinetes de advogados, na sua maioria também baseados em Lisboa e que lhes fornecem serviços.

A CMVM está a regular este mundo, não o mundo das PMEs espalhadas por esse país fora, que têm outros problemas. As empresas cotadas são empresas de sucesso e têm recursos substanciais.

Há limites para o mau funcionamento da Euronext Lisboa, sobretudo do mercado das acções. Claramente, devia haver alterações das regras de governo das sociedades cotadas. Recordo que o governo das sociedades consiste na regulação do poder dentro das empresas para garantir a criação de valor para o accionista. Ora em Portugal muitas vezes não existe uma clara separação entre os papéis de Chairman e CEO. Isso leva a conflitos de interesses como aliás foi exposto em vários casos recentes. A CMVM devia tentar encontrar uma solução para este problema, que também passa pela nomeação de administradores independentes.

Para além disso, existem claramente conflitos de interesse por se escolherem os auditores das empresas para efectuar trabalhos de consultora, numa promiscuidade pouco sã. De novo, a CMVM devia obrigar a uma separação de papéis e pedir para que houvesse uma renovação anual dos auditores (e não simplesmente uma mudança do ROC da mesma firma de auditoria).

Toda a gente sabe e aliás artigos científicos comprovam que existe insider trading na Euronext Lisboa. Existe há vários anos e ninguém faz nada. A solução é extremamente simples. Consiste em impor chinese walls ou seja barreiras de informação entre os vários departamentos dos bancos para que a informação recolhida por um departamento não seja usada por outro.

Alem disso, haveria que obrigar as pessoas que trabalham em mercados de capitais em Lisboa a seguirem formação sobre as suas obrigações, o que não é o caso actualmente. O equivalente daquilo que já se faz nas praças de Nova Iorque ou de Londres. Finalmente, haveria que assegurar que aqueles que são responsáveis por insider trading são julgados e condenados, o que de novo, não acontece. O que é certo é que nunca ninguém é condenado por insider trading em Portugal. Claro que isto tem a ver com a ineficiência da justiça.

O que surpreende é a impunidade, ou seja a equipa à frente da CMVM continua a ser a mesma e ninguém a tira de lá.