A proposta da aquisição da TVI pela PT é um símbolo dos nossos tempos.
O facto do governo ter arriscado apoiar a operação para (segundo se diz) influenciar a escolha editorial da TVI, é um resultado de um estado de coisas actual, no qual o poder está ligado às fontes de informação. A TVI representa uma das principais fontes de informação oficial em Portugal e o Governo terá, segundo se diz, querido influenciar o conteúdo dos seus noticiários. O poder e a importância do Governo passa pela sua capacidade em influenciar aquilo que se diz nos tele-jornais. As imagens competem contra as imagens. As pessoas são cada vez mais criaturas visuais e respondem a imagens a um nível mais visceral do que a palavras.
Porque é que a PT se interessou por uma empresa de media? Não existem sinergias evidentes entre a PT e um negócio de televisão. O talento fundamental da PT é manter uma situação de oligopólio em Portugal para defender as suas margens. Outra competência marginal da empresa é a capacidade de operar redes de telecomunicações. Já a TVI tem como principal factor de competitividade a capacidade de gerar receitas publicitarias. São competências muito diferentes e que não trazem sinergias significativas. Actualmente os canais de televisão têm muito pouca produção de conteúdos, quase exclusivamente telejornais. Os outros conteúdos são comprados no estrangeiro ou produzidos por independentes.
As empresas de media tiveram um primeiro movimento de integração vertical nos Estados Unidos na década de 80. O ponto mais alto desse movimento foi a criação da Time Warner, uma fusão que levou à formação de um gigante com interesses no cabo, no cinema e na produção de conteúdo para a televisão, na edição de livros e revistas e finalmente na música.
Mais tarde a empresa junto a Internet a um leque de actividades diversificadas, para criar a AOL Time Warner.
A experiência não foi um grande sucesso, como mostra o gráfico abaixo, que compara a cotação da empresa com o índice S&P 500 (AOL Time Warner em azul)
Não se entende como é que a PT pensava contrariar uma tendência de mercado ou seja o falhanço do modelo de integração vertical nos media.
A única razão da venda é que a Prisa está desesperadamente a vender activos, mais um símbolo dos nossos tempos. A Prisa está endividada e com os mercados de capital no estado em que estão, não se consegue financiar. Por isso não tem outra opção senão vender activos, neste caso a TVI. De facto, as empresas de media têm sido muito castigadas pela crise e muitas já faliram, tanto na Europa como na América do Norte.
Finalmente, noto que, nos inúmeros artigos que foram escritos sobre o negócio, não aparece uma única vez uma referência a um múltiplo de EBITDA, para justificar se a PT estava a pensar comprar por um múltiplo baixo. Calculo que seja a principal motivação ou seja a capacidade de adquirir uma empresa interessante por um preço muito baixo.
Agora que o apoio do Governo desapareceu, vai provavelmente surgir um comprador do mesmo sector que possa derivar sinergias da aquisição. O que prova que em Portugal um dos poucos sectores onde ainda se podem fazer aquisições sem a intervenção do Governo continuam a ser os media.