Monthly Archives: July 2009

Reacção ao programa de governo do PS – parte sobre regulação financeira

Tive curiosidade em ler o programa eleitoral do PS no que toca à regulação financeira. O PS pretende:

“Reformar o modelo de supervisão, através da criação de um sistema dualista, assente numa autoridade responsável pela supervisão prudencial – reforçando os poderes do Banco de Portugal – e numa autoridade responsável pela supervisão comportamental com responsabilidades transversais em todo o sector financeiro (banca, seguros e fundos de pensões, e mercado de capitais)”

O lado mais positivo é que o PS está a reconhecer aquilo que mencionei aqui várias vezes. A regulação deve assentar em princípios e não em regras burocráticas. Penso que é isso que se pretende quando se fala a de uma entidade responsável pela supervisão comportamental.

No entanto, será que vamos assistir à criação de mais uma instituição, com mais funcionários, mais um plano de pensões e mais encargos para o contribuinte?

Outros países tais como o Reino Unido, já tomaram a iniciativa de lançar a FSA (Financial Services Authority) que é uma entidade única cuja função é exactamente a mesma que aquela que é proposta agora pelo PS.

Acontece que os planos agora são para separar a FSA em várias entidades, já que a instituição se revelou ineficiente.

O documento apresenta outra intenção de reforma:

“Introduzir a supervisão macro-prudencial, alargando o mandato do Conselho Nacional de Estabilidade Financeira e reforçando o mandato do Banco de Portugal, que representará as autoridades nacionais no futuro Conselho Europeu de Risco Sistémico e que passará a ter a seu cargo o acompanhamento e análise dos riscos sistémicos em Portugal, apresentando no Conselho Nacional de Estabilidade Financeira as recomendações necessárias para fazer face a esses riscos”.

Mas afinal, o que significa supervisão macro-prudencial? Este artigo no site da voxeu.org explica, bem como a Investopedia. Trata-se de uma análise da saúde e das vulnerabilidades de um sistema financeiro. Na prática, economistas controem modelos do sistema financeiro e depois levam o modelo a situações limite. Mais modelização – a solução para que este tipo de crises nunca mais volte a acontecer seria pois construir mais modelos financeiros, com técnicos que informam os governos sobre os indicadores e seu significado. Os governos de seguida supostamente tomam medidas de correcção apropriadas.
Isto significa que ninguém faz isto, neste momento? Não há pessoas que tenham um modelo do sistema financeiro e que o submetam a certos testes, para em seguida alertarem as autoridades sobre possíveis problemas? Vai ser preciso criar? Então o que fazem realmente as pessoas no departamento de estudos do Banco de Portugal? Mistério.
Realmente, urge lançar a análise macro-prudencial. Mas não me parece que seja necessário debater isto e inserir em programa de governo. Isto é apenas senso comum. Devia ser implementado – já.
Gostava também de falar dos métodos de auditoria electrónica. Trata-se de uma análise bottom-up. O Banco de Portugal passaria a pedir os dados do crédito concedido em formato electrónico. Depois haveria um trabalho de monitorização das condições de crédito. Sempre que fosse detectada uma anomalia, seriam feitas perguntas ao banco sobre um tipo de operação ou até uma operação.
Muita gente gosta de atribuir culpa daquilo que aconteceu no BPN à globalização, ao sistema financeiro. Ou então como o primeiro ministro, dizer que a culpa é mesmo da crise que vem lá de for.
Ao invés, parece-me que as entidades de supervisão perderam poder e não acompanharam o progresso, o que significa que nunca adoptaram métodos de supervisão macro-prudencial nem auditoria electrónica. As políticas do PS e do PSD nos últimos anos têm todas algo em comum. Todas permitem uma certa falta de responsabilidade na gestão dos bancos.
O que se passou em Portugal durante os últimos anos é que, à medida que a economia definhava, alguns bancos começaram a ter problemas. Concretamente, o BPN era uma instituição sem rumo, sem estratégia e sem factor de diferenciação a competir em um mercado com excesso de capacidade. Para atingir lucros, os dirigentes começaram a tomar cada vez mais riscos. Como a regulação financeira, pouco eficiente e que eles conheciam por dentro, não controlava a sua actividade em pormenor, a cúpula do BPN passou para o outro lado e começou a praticar burlas. Acabou mal.

Para além da necessidade de mais supervisão macro-prudencial e mais auditoria informática, para resolver a situação, as pessoas que estão no Poder vão ter que admitir que há demasiados bancos em Portugal. Há excesso de capacidade. Não pode continuar assim. Isso quer dizer que alguns “amigos” do PS nas administrações dos bancos vão ter que ser sacrificados. Alguns bancos vão ter que ser comprados e eles vão perder os cargos. E isso é uma decisão muito difícil para o PS.

Human Genome Sciences

Os executivos da Human Genome Project, uma empresa de biotecnologia sediada em Rockville, Maryland (onde?) estavam à espera dos resultados da fase III dos testes de um medicamento para Lupus (doença que afecta cerca de 5 milhões de pessoas em todo o mundo). Contrariamente às expectativas, os resultados foram positivos.
Trata-se de uma doença difícil de tratar e este medicamento poderá ter muito sucesso. Francamente, não sei o suficiente para dar a minha opinião.
A acção da Human Genome Sciences disparou como mostra o gráfico abaixo (Human Genome Sciences linha roxa contra o S&P a azul).

Será uma boa altura para comprar acções da empresa? Bem, se olharmos para trás, esta empresa já teve cotada a mais de $100 por acção e antes deste resultado, valia apenas alguns “cents” o que se chama um “penny stock”. Trata-se pois de uma opção para valentes ou para alguém que conheça a fundo o sector, como mostra o gráfico abaixo:

Quem tiver conhecimento cientifico suficiente para entender se a avaliação está correcta pode lançar-se.

Excesso de confiança, bridge e Wall Street

Sugiro a leitura deste artigo do New Yorker sobre o Bear Stearns, o jogo de bridge e o papel da confiança nas decisões dos participantes no mercado de capitais.

O autor é Malcolm Gladwell – li com atenção e partilho as convicções do autor.

Banco de Portugal, análise top-down e análise bottom-up

Sou da opinião que o Banco de Portugal errou no seu papel de supervisão.

Um banco central tem várias funções. Uma delas é estudar a economia. Outra é assegurar a supervisão dos bancos.
Estudar a economia implica recolher dados e pagar a técnicos para escreverem relatórios sobre a economia. Também implica transmitir as principais conclusões aos governantes e à comunicação social. O Banco de Portugal é perito em estudos económicos e foi-me dito que um grande número de quadros se dedica a esta função. O perfil e a formação é de economista. Penso que existe uma grande tradição de análise económica no Banco de Portugal. É uma análise top-down.
Assegurar a supervisão bancária implica um trabalho mais próximo da auditoria. Nos tempos de hoje, os bancos centrais mais avançados pedem aos bancos comerciais os dados de todo o crédito concedido. Trata-se de uma grande quantidade de dados com os principais indicadores do crédito concedido pelos bancos. Caso a caso – bottom up.
O trabalho dos técnicos de supervisão dos bancos centrais consiste em analisar esses dados e encontrar casos nos quais os critérios normais de concessão de crédito não são respeitados. Vou dar um exemplo: um banco que concede crédito a uma empresa que já está de tal modo endividada que não poderá sobreviver. Ou um crédito que é concedido sem recolha de informação suficiente sobre o credor (no estilo subprime). A isto chama-se auditorias informáticas.
Trata-se de uma tarefa que exige competências que não se aprendem nas faculdades de economia. As pessoas que trabalham neste tipo de análise têm um perfil mais ligado à análise estatística e conhecem informática o suficiente para analisarem resmas de dados e tirarem conclusões que escapam ao comum dos mortais.
Trata-se de um problema de recursos humanos. Uma pessoa que consiga analisar dados de crédito e detectar irregularidades, que tenha capacidades de tratar dados com esse pormenor, procura ser trader de um hedge fund e ganhar dinheiro fazendo arbitragem. Não vai naturalmente procurar fazer o bem comum e trabalhar para o Banco de Portugal. Até porque há muitos riscos de ninguém entender muito bem o que ele pretende e não ser ouvido pelos restantes funcionários.
Assim, é sabido que o departamento de estudos do Banco de Portugal produz estudos que na sua maior parte não são lidos e que o departamento de supervisão do Banco de Portugal é muito pequeno já que as pessoas com as valências adequadas para a supervisão preferem trabalhar directamente nos mercados financeiros.

BPN, Parlamento e Banco de Portugal

Há alguns dias, escrevi um comentário a um post do Pedro Pita Barros no blog da SEDES, sobre o BPN, Parlamento e Banco de Portugal. Desde já agradeço a resposta do Pedro Pita Barros. Não quero prolongar demasiado a discussão, mas só gostava de acrescentar o seguinte:

  1. Pedro Pita Barros é da opinião que o Banco de Portugal não falhou totalmente. De facto, estamos em desacordo. A meu ver, a nacionalização de um banco no qual houve fraude é um falhanço total da regulação. Como refere Pedro Pita Barros, o BPN já estava a ser investigado antes da nacionalização. O Banco de Portugal tinha à sua disposição um arsenal de medidas correctivas que podia ter accionado. Sem querer ser exaustivo estou a pensar, entre outras medidas, no seguinte: (i) censura pública (ii) multas (iii) proibição de exercer actividade bancária para parte do banco (o que talvez tivesse permitido salvar alguns departamentos do BPN, sacrificando outros);
  2. Pedro Pita Barros não é da opinião que o Banco de Portugal devia ter tido uma intervenção mais cedo. Eu realmente não estou de acordo. A partir do momento em que havia suspeita, penso que devia ter sido pedida informação. Se a informação se revelasse insuficiente, rapidamente o Banco de Portugal devia ter aplicado uma das sanções que menciono no ponto anterior;
  3. Finalmente, Pedro Pita Barros é da opinião que o facto do Banco de Portugal não detectar falhas não revela incompetência. Tenho a opinião contrária, como fácilmente se pode concluir do ponto anterior. Penso que a incompetência tem muitas maneiras de se manifestar. Não faltou tempo ao Banco de Portugal e não são precisos tantos recursos como isso para pedir uma lista de informação. Basta enviar um e-mail. Se a resposta é insuficiente ou revela falhas, as sanções descritas acima também não me parecem muito difíceis de implementar e não deveriam ocupar muitos recursos.

Inovação e crise financeira

Em Junho, Vítor Constâncio declarou que haverá “menos inovação financeira” por causa da crise.

Não sei se concordo.

Primeiro convém entender o que se entende por inovação financeira. Contrariamente a uma farmacêutica ou uma empresa tecnológica, os bancos não introduzem novos produtos depois de cientistas se terem debruçado sobre um problema, feito testes e outras diligências que normalmente associamos com o processo de investigação. Os chamados produtos financeiros são serviços prestados pelos bancos aos seus clientes e aos investidores. São formalizados em contratos e simulados em folhas de cálculo.
Em traços largos penso que é agora que vamos testar a inovação produzida no ciclo anterior. Alguns produtos já foram testados e falharam. Outros provaram ser mais resistentes. Esta crise vai ser a base para o lançamento da nova geração de inovação financeira.

Como ilustra a curva de Bell que se segue, a maior parte do tempo os mercados financeiros (nos quais incluo os mercados organizados de renda fixa e renda variável mas também o private equity e os produtos derivados) estão a lidar com situações, preços de activos e um contexto económico que se situam entre dois desvios-padrão. Trata-se daquilo a que podemos chamar de situação normal de mercado.

Podem interpretar a curva acima como representando os preços das acções ou o yield das obrigações, os retornos do private equity ou ainda o crescimento do PIB. O meu argumento é geral.
Li recentemente em uma apresentação de uma pessoa que trabalha no mercado de estruturação de dívida, que tudo o que se passou depois de Agosto de 2007 faz parte da zona azul clara e cinzenta do lado esquerdo da curva. Estamos a falar de ocorrências que estão fora de dois desvios-padrão. Por exemplo quando falamos do mercado das acções estamos a falar de uma redução do preço das acções comparável ao do crash de 1929.

O que é que isto tem a ver com a inovação? Bem, enquanto os mercados estão em alta ou seja enquanto estamos do lado direito da curva na zona azul escura e laranja, há uma série de inovações financeiras. Quando as coisas correm bem, é inevitável que certas pessoas, sem dúvida aliciadas com perspectivas de lucros, comecem a testar produtos novos quando o mercado está na alta. Foi assim que em 2005 e 2006 houve um grande desenvolvimento do já famoso subprime e de instrumentos tais como CDOs e CLOs, RMBSs e por aí fora.

Quando as coisas correm bem, as pessoas pensam em aquilo que poderia resultar ainda melhor e tomam grandes riscos. O mundo financeiro move-se desta maneira, pela constante busca de produtos de maior margem. Mas as inovações não podem ser testadas em mercados em alta já que por definição, está tudo a correr bem.

Ao invés, as inovações são testadas quando estamos do lado esquerdo da curva e à esquerda dos dois desvios-padrão como o que sucede agora. São os chamados “tail events“. Só em forte ambiente recessivo é que há verdadeiramente um teste dos modelos que resistem ao ciclo.

Outra pergunta é se as inovações em questão de certo modo causam os “tail events“.

De qualquer modo, veio-se revelar que algumas das inovações que foram desenvolvidas ou implementadas em grande escala em 2005 e 2006, tais como os CDOs, não estavam preparadas para conjunturas fortemente recessivas.

Resta saber se outras inovações tais como os CDS (credit default swaps) estão de facto preparados para sobreviver.
Claro que também existem tail events do lado direito da curva. Por exemplo, podemos considerar que o ano de 1999 no mercado das acções foi um tail event do lado direito da curva.
Para mim o que ficou claro com esta apresentação é que os LBOs, que não serão uma grande inovação mas que se afirmaram durante o último bull market, vão sobreviver à crise. Os fundos de private equity vão sofrer e alguns vão desaparecer. Mas aqueles que sobreviverem vão sair disto mais fortes do que nunca, precisamente porque resistiram a um “tail event“.

As opções, os hedge funds, decerto vão sofrer alterações durante os próximos anos, mas são duas realidades que a meu ver, também vão sobreviver ao duro teste da crise. Também o modelo de banca de investimento me parece destinado a sobreviver.

Este argumento é mais geral. Muitas inovações surgiram nos anos que se seguiram a uma crise financeira. Depois do crash de 1929, os anos 30 foram marcados por grande inovação. Nos Estados Unidos, Thomas Edison lançou a General Electric. Na Alemanha, tentou-se um novo modelo de banco industrial chamado Deutsche Bank. Os anos 70 foram marcados pelos choques petrolíferos mas isso não impediu Bill Gates e Steve Jobs de darem os primeiros passos para a criação de uma indústria em torno do computador pessoal. O Japão está a viver uma “década perdida” mas isso não impediu que a Toyota lançasse veículos hibridos de grande sucesso.
As empresas que sobreviverem a 2009 e 2010 são capazes de ter alguns truques na manga.

Até onde iria para ganhar dinheiro?

Para quem esteja interessado em saber até onde é que uma pessoa a trabalhar numa instituição financeira está disposta a ir para ganhar uns cobres – penso que esta notícia serve de exemplo. O órgão de supervisão financeira de Hong Kong, a Hong Kong Monetary Authority, concluíu na sequência de um inquérito, que bancos de Hong Kong venderam instrumentos financeiros complexos e arriscados e pequenos investidores vulneráveis.

Tais instrumentos eram demasiado complexos para serem entendidos pelos próprios bancos que os emitiram, quanto mais pequenos investidores. Foram emitidos pelo Lehman Brothers e vendidos por bancos de Honk Kong a idosos e mesmo a pessoas com doenças mentais.

Houve 102 casos. Verídico, como podem verificar aqui.

SRU Porto Vivo (3)

Sem querer entrar no pormenor do artigo publicado no Jornal de Notícias a 6 de Julho, gostaria só de referir o seguinte: segundo Arlindo Cunha, presidente da SRU Porto Vivo, é preciso esperar 30 meses (não são semanas – leram bem, meses) de burocracia para começar uma obra de reconversão de um edifício na Baixa Portuense.

Arlindo Cunha diz que a culpa é da tutela governamental. Há mais pormenores no artigo que pode ser encontrado aqui e que aliás confirma que quatro anos depois (ou seja, 208 semanas) ainda não há uma única obra concluída.
O que espanta é que ainda há promotores imobiliários que mostram interesse em recuperar edifícios antigos. Tudo isto é surreal.

Sancho Silva

Nesta obra chamada “displacements” Sancho Silva trata da decoração da casa do embaixador de Portugal em Berlim para uma recepção a artistas.

Os objectos que já faziam parte da casa mas que mudados de um lado para outro, incluem um pneu (foto abaixo), uma cebola, uma garrafa de ketchup vazia, um bocado de madeira e um cabide entre outros.

Confesso que me ri muito com o sentido de humor do trabalho mas olhem que o embaixador que autorizou a instalação (o nome não ficará para a história) também mostrou ser uma pessoa descontraída.
E claro, podem ver mais trabalhos no blog dele.

Rita Portugal Lima


Neste trabalho, intitulado “divergence” e que faz parte de uma candidatura à participação de Macau na bienal de Veneza, Rita Portugal Lima mostra um mapa mundo feito de palavras e ligado com fios de lã.

Podem ver mais trabalhos no seu blog.