Tive curiosidade em ler o programa eleitoral do PS no que toca à regulação financeira. O PS pretende:
“Reformar o modelo de supervisão, através da criação de um sistema dualista, assente numa autoridade responsável pela supervisão prudencial – reforçando os poderes do Banco de Portugal – e numa autoridade responsável pela supervisão comportamental com responsabilidades transversais em todo o sector financeiro (banca, seguros e fundos de pensões, e mercado de capitais)”
O lado mais positivo é que o PS está a reconhecer aquilo que mencionei aqui várias vezes. A regulação deve assentar em princípios e não em regras burocráticas. Penso que é isso que se pretende quando se fala a de uma entidade responsável pela supervisão comportamental.
No entanto, será que vamos assistir à criação de mais uma instituição, com mais funcionários, mais um plano de pensões e mais encargos para o contribuinte?
Outros países tais como o Reino Unido, já tomaram a iniciativa de lançar a FSA (Financial Services Authority) que é uma entidade única cuja função é exactamente a mesma que aquela que é proposta agora pelo PS.
Acontece que os planos agora são para separar a FSA em várias entidades, já que a instituição se revelou ineficiente.
O documento apresenta outra intenção de reforma:
“Introduzir a supervisão macro-prudencial, alargando o mandato do Conselho Nacional de Estabilidade Financeira e reforçando o mandato do Banco de Portugal, que representará as autoridades nacionais no futuro Conselho Europeu de Risco Sistémico e que passará a ter a seu cargo o acompanhamento e análise dos riscos sistémicos em Portugal, apresentando no Conselho Nacional de Estabilidade Financeira as recomendações necessárias para fazer face a esses riscos”.
Mas afinal, o que significa supervisão macro-prudencial? Este
artigo no site da voxeu.org explica, bem como a
Investopedia. Trata-se de uma análise da saúde e das vulnerabilidades de um sistema financeiro. Na prática, economistas controem modelos do sistema financeiro e depois levam o modelo a situações limite. Mais modelização – a solução para que este tipo de crises nunca mais volte a acontecer seria pois construir mais modelos financeiros, com técnicos que informam os governos sobre os indicadores e seu significado. Os governos de seguida supostamente tomam medidas de correcção apropriadas.
Isto significa que ninguém faz isto, neste momento? Não há pessoas que tenham um modelo do sistema financeiro e que o submetam a certos testes, para em seguida alertarem as autoridades sobre possíveis problemas? Vai ser preciso criar? Então o que fazem realmente as pessoas no departamento de estudos do Banco de Portugal? Mistério.
Realmente, urge lançar a análise macro-prudencial. Mas não me parece que seja necessário debater isto e inserir em programa de governo. Isto é apenas senso comum. Devia ser implementado – já.
Gostava também de falar dos métodos de auditoria electrónica. Trata-se de uma análise bottom-up. O Banco de Portugal passaria a pedir os dados do crédito concedido em formato electrónico. Depois haveria um trabalho de monitorização das condições de crédito. Sempre que fosse detectada uma anomalia, seriam feitas perguntas ao banco sobre um tipo de operação ou até uma operação.
Muita gente gosta de atribuir culpa daquilo que aconteceu no BPN à globalização, ao sistema financeiro. Ou então como o primeiro ministro, dizer que a culpa é mesmo da crise que vem lá de for.
Ao invés, parece-me que as entidades de supervisão perderam poder e não acompanharam o progresso, o que significa que nunca adoptaram métodos de supervisão macro-prudencial nem auditoria electrónica. As políticas do PS e do PSD nos últimos anos têm todas algo em comum. Todas permitem uma certa falta de responsabilidade na gestão dos bancos.
O que se passou em Portugal durante os últimos anos é que, à medida que a economia definhava, alguns bancos começaram a ter problemas. Concretamente, o BPN era uma instituição sem rumo, sem estratégia e sem factor de diferenciação a competir em um mercado com excesso de capacidade. Para atingir lucros, os dirigentes começaram a tomar cada vez mais riscos. Como a regulação financeira, pouco eficiente e que eles conheciam por dentro, não controlava a sua actividade em pormenor, a cúpula do BPN passou para o outro lado e começou a praticar burlas. Acabou mal.
Para além da necessidade de mais supervisão macro-prudencial e mais auditoria informática, para resolver a situação, as pessoas que estão no Poder vão ter que admitir que há demasiados bancos em Portugal. Há excesso de capacidade. Não pode continuar assim. Isso quer dizer que alguns “amigos” do PS nas administrações dos bancos vão ter que ser sacrificados. Alguns bancos vão ter que ser comprados e eles vão perder os cargos. E isso é uma decisão muito difícil para o PS.